13 de setembro de 2013

Um adeus.


Vovó,


Será preciso muito tempo para a sua ausência ser aceita. Por enquanto vou realizando, a cada dia, novas experiências por conta de sua partida no domingo. A primeira vez que ouço a Asa Branca, a primeira vez que percorro a Barão de Studart, tão ligada à minha infância, a primeira vez que pedalo, a primeira quarta-feira... enfim, uma infinidade de "novas" experiências por você não estar mais neste mundo. É quase inaceitável. São 35 anos de você, sempre ali...

Estou me despedindo de muitas lembranças nestes dias. Meus cartões postais endereçados à rua Cel. Linhares cessarão. O segundo café-da-manhã afanado no Paracuru não será mais repreendido. Da mesma forma, não precisarei mais correr e atravessar o sítio para lhe desejar Feliz Ano Novo. Meus telefonemas para o 6560 para escutar um "Prooonto!" também chegaram ao fim. Uma lembrança a menos em minhas viagens, uma recordação que não precisarei mais fazer... Coisas tão pequenas, mas que para mim tinham tanto significado.

Mas você persistirá, mais uma vez. Como uma árvore que foi cortada, se foram os seus ramos, os seus olhos azuis, o sorriso na sua face e seus cabelos macios; mas ficaram as raízes, fincadas sob o solo, escondidas em nossas almas: seus ensinamentos, naquela voz única, seus exemplos, suas palavras de contemplação do mundo, da infinitude dos oceanos, da admiração que a senhora tinha daquilo que Deus havia feito neste mundo, imperfeito pela maldade humana.

Repouse, vó. A senhora esteve aqui por muito tempo. Seríamos dos mais egoístas se aspirássemos ainda mais sua persistência conosco. A senhora conheceu a vida trinta e um anos após terminar o Império brasileiro, dois anos após terminar a Primeira Guerra, nosso presidente era Epitácio Pessoa, seus pais, e muitos daqueles que conviveram consigo, nasceram ainda no século XIX. Tendo casado em 1937, a senhora esteve "casada" por 76 anos! Foram anos como casada o que muitas pessoas não tem de vida!

Parabéns, vó! Você viveu uma vida histórica, que faz parte da história de um país já tão distante. Com a sua partida, também lamento que tantas lembranças que a senhora bem guardava na memória irão com você. Viveu em muitas cidades no interior do estado, em épocas de estradas carroçais, medicina precária, comunicações lentas e distâncias em léguas. Criou e perdeu filhos neste cenário inóspito que foi o Ceará em meados do século XX. Muitos hoje são incapazes de suportar os fardos que a vida traz, criando famílias de um ou dois filhos, e a senhora conseguiu, mudando sempre de cidade em cidade, criar cinco dentre oito filhos. Tento imaginar quantas pessoas assim, como esta história de vida, existiriam em Fortaleza. Não devem ser muitas.

E eu, seu neto que não tem Barroso no nome, me despeço e prometo: no dia em que as estrelas caírem do céu vamos nos reencontrar e nossas arengas retornarão.


Tantos beijos quanto o céu possa suportar
Nivardinho, seu caboclo.

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